Tito 3.1-15
Publicado em 09/08/2025
“Viva à Altura da Graça que Recebeu”
Tito 3.1-15
Introdução
Vivemos numa era em que a memória espiritual parece cada vez mais curta. Muitos cristãos se esquecem de onde vieram, do que receberam e do que são chamados a fazer. Como se a vida cristã fosse apenas um evento do passado — o dia em que “aceitaram Jesus” — e não uma jornada contínua de transformação. Paulo, escrevendo a Tito, não apenas combate heresias ou organiza lideranças, mas entrega um lembrete pastoral: a graça que salva é a graça que transforma.
O capítulo 3 da carta a Tito é uma convocação ao viver cristão que corresponda à salvação recebida. Trata-se de viver à altura da graça: uma graça que nos achou perdidos, nos regenerou pelo Espírito, nos justificou em Cristo e agora nos impulsiona à ação.
Em sete lembretes poderosos, Paulo nos chama a uma vida de integridade, de memória da redenção, de utilidade prática, de generosidade, de missão e de graça. Esses lembretes não são moralismos, mas ecos da graça divina que nos educa (Tito 2.11-12) a viver com sobriedade, justiça e piedade, aguardando a bendita esperança.
A vida cristã deve ser visível nas esferas públicas e privadas. A submissão às autoridades não é uma simples conformidade, mas uma expressão da nossa confiança na soberania de Deus (Rm 13.1-7). Quando Paulo orienta que sejamos obedientes e prontos para o bem, ele está dizendo que nossa fé deve ser ativa e responsável no contexto da sociedade. Essa obediência é fruto da transformação interna, não de medo, mas de convicção ética e espiritual.
Além disso, a amabilidade e a mansidão devem marcar nossas relações interpessoais. “Não caluniar”, “ser pacífico” e “mostrar mansidão” são virtudes que revelam o fruto do Espírito (Gl 5.22-23). Vivemos em uma sociedade polarizada, repleta de discursos ásperos, e o cristão é chamado a ser um pacificador (Mt 5.9), um agente da reconciliação que reflete a brandura de Cristo mesmo diante das ofensas.
Amabilidade não é fraqueza, é força sob controle. Jesus, manso e humilde de coração (Mt 11.29), não deixava de confrontar o pecado, mas o fazia com sabedoria e amor. Quando somos amáveis com os que nos perseguem ou pensam diferente de nós, tornamo-nos verdadeiras cartas vivas do Evangelho (2Co 3.2-3), demonstrando que o Reino de Deus opera em nosso caráter.
Paulo nos convida à memória da miséria que nos habitava antes da graça. “Éramos insensatos, desobedientes, enganados...” (v.3). Essa lista não visa condenar, mas despertar em nós um senso de gratidão e humildade. O verdadeiro convertido jamais se esquece de onde Deus o tirou. Essa lembrança quebra o orgulho espiritual e gera compaixão pelos perdidos.
A grande virada está no “mas” do versículo 4: “Mas quando se manifestaram a bondade e o amor de Deus...”. O centro da salvação não está em nós, mas em Deus. Ele nos salvou não por nossos méritos, mas “pela sua misericórdia” (v.5). Isso reforça a doutrina da justificação pela fé, baseada exclusivamente na graça (Ef 2.8-9). A regeneração e renovação pelo Espírito Santo são obras divinas que operam uma nova criação (2Co 5.17).
O resultado dessa ação salvadora é duplo: justificação e herança. Somos declarados justos diante de Deus (Rm 5.1) e feitos coerdeiros com Cristo (Rm 8.17). A vida eterna não é apenas um destino, mas uma realidade presente que nos molda aqui e agora. Quem se lembra que foi salvo pela graça jamais vive com soberba espiritual, mas com reverência, temor e alegria em servir.
As palavras têm poder. Paulo encoraja Tito a afirmar com firmeza a verdade da salvação pela graça, a fim de que os crentes se dediquem às boas obras. Aqui, vemos um equilíbrio entre ortodoxia (crer corretamente) e ortopraxia (viver corretamente). Uma fé sem obras é morta (Tg 2.26), e uma prática sem fundamento bíblico é vazia.
Por outro lado, Paulo adverte contra conversas inúteis: genealogias, contendas sobre a lei, divisões. Isso não significa que a teologia não deva ser discutida, mas que não devemos perder tempo com debates estéreis, que não produzem edificação. Infelizmente, muitos crentes preferem “ganhar discussões” a ganhar almas. Isso revela um coração não centrado no Evangelho, mas no ego.
A orientação de rejeitar o que provoca divisões é séria. A disciplina eclesiástica, quando aplicada com amor, visa preservar a saúde da igreja. Um crente que insiste em semear discórdia, mesmo após admoestações, revela um coração pervertido (v.11). A igreja precisa proteger sua unidade, mantendo o foco na proclamação de Cristo e na edificação do Corpo.
O chamado ministerial tem fases. Paulo, ao mencionar Ártemas ou Tíquico, revela a dinâmica da obra missionária. Tito deveria se preparar para deixar Creta e encontrar-se com Paulo em Nicópolis. Isso mostra que o ministério é transitório: Deus levanta obreiros para momentos e contextos específicos.
Há uma urgência no “faça o possível para vir ao meu encontro”. O tempo da missão não é infinito. Jesus declarou: “Enquanto é dia, precisamos realizar a obra daquele que me enviou; a noite se aproxima, quando ninguém pode trabalhar” (Jo 9.4). A igreja precisa discernir que há portas que se abrem por tempo determinado, e precisamos aproveitá-las com zelo.
Isso também fala da importância de responder ao chamado com prontidão. Tito não deveria se acomodar em Creta, mas estar disponível para o próximo passo. Isso exige desapego, fé e visão do Reino. O obreiro fiel está sempre pronto para ser deslocado por Deus. Lembrar que a missão tem prazo é viver com urgência espiritual.
O discipulado também inclui mordomia. Paulo orienta Tito a providenciar o necessário para a viagem de Zenas e Apolo. Isso demonstra que a missão não avança apenas com disposição, mas também com provisão. O apoio logístico é parte da obra espiritual.
Contribuir é mais que doar dinheiro: é envolver-se com os que servem, aliviar cargas, facilitar o avanço do Evangelho. A igreja primitiva entendeu isso (At 4.32-35), e Paulo reforça que os que são instruídos na Palavra devem repartir com os que os instruem (Gl 6.6). A generosidade não é um peso, mas um privilégio.
Quando investimos nos enviados, estamos plantando no Reino. Deus ama quem dá com alegria (2Co 9.7), e Ele é poderoso para multiplicar essa sementeira. Uma igreja que sustenta missionários, projetos e obreiros está colocando seus recursos no que é eterno. Isso é viver à altura da graça recebida.
A improdutividade é incompatível com a fé viva. Paulo desafia os crentes a aprenderem a praticar boas obras. Isso implica intencionalidade, aprendizado e esforço. Não nascemos prontos, mas somos ensináveis pelo Espírito e pela Palavra.
Ser produtivo é viver com propósito. Cada cristão é um instrumento de Deus para suprir necessidades e manifestar o amor divino. O apóstolo Pedro exorta: “Cada um exerça o dom que recebeu para servir aos outros” (1Pe 4.10). A ociosidade espiritual é sinal de imaturidade ou de doença na alma.
A produtividade aqui não é apenas social, mas espiritual. Produzimos frutos quando permanecemos em Cristo (Jo 15.5). Esses frutos se expressam em amor, serviço, evangelismo, discipulado e generosidade. A igreja precisa formar crentes que não apenas consomem, mas contribuem com a edificação do Corpo.
O encerramento da carta é cheio de ternura e poder. “A graça seja com todos vocês” não é uma saudação formal, mas uma bênção carregada de sentido. É a graça que nos salvou, nos sustenta e nos guiará até o fim.
A vida cristã não é possível sem a graça de Deus. É ela que nos dá forças nas fraquezas (2Co 12.9), que nos educa a renunciar à impiedade (Tt 2.11-12), que nos sustenta em meio às provas (Hb 4.16). Ao lembrar que a graça está conosco, Paulo está dizendo: “Você não está só”.
Essa graça é suficiente, abundante e presente. Que nunca nos esqueçamos disso. Nossa resposta deve ser viver uma vida que exalte essa graça, como Paulo declarou: “Pela graça de Deus, sou o que sou, e a sua graça para comigo não foi em vão” (1Co 15.10).
Ilustração real
Em 2010, um minerador chamado Edison Peña ficou preso por mais de dois meses na mina San José, no Chile, junto com outros 32 trabalhadores. Durante esse tempo no escuro, ele passou a correr dentro do túnel e cantar músicas de Elvis Presley. Edison disse que correr o ajudava a lembrar de que estava vivo e de que um dia sairia dali. Quando foi resgatado, declarou que a lembrança da vida lá fora o manteve firme. Assim também, os lembretes espirituais de Tito 3 nos mantêm firmes quando estamos cercados de trevas, lembrando-nos de quem somos, de quem é o nosso Deus e da esperança que nos aguarda. E principalmente para vivermos à altura da Graça que recebemos.
Conclusão com apelo evangelístico e de consagração
Tito 3 é uma carta de lembretes. Lembretes que nos despertam da inércia, nos corrigem na caminhada e nos alinham com o coração de Deus. Hoje, o Senhor te convida a lembrar quem você era, o que Ele fez por você, e como Ele quer que você viva à altura da Graça que recebeu.
Você já experimentou essa graça salvadora? Ela está disponível para todo aquele que se arrepende e crê em Jesus. E para você que já foi alcançado, Deus está te chamando à consagração — a uma vida obediente, amável, produtiva e generosa.
Decida hoje viver como quem se lembra da graça que o salvou. E que, ao final da jornada, você possa ouvir do Senhor: “Muito bem, servo bom e fiel”.
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